domingo, 3 de fevereiro de 2013

A GUERRA DOS SINOS

Quando o sol desponta sobre a imensa planície, exatamente às seis da manhã, os habitantes da cidade de Santa Isabel são despertados pelos sinos da igreja de santa padroeira que dá nome à cidade. Com a mesma pontualidade com que anuncia a matinada, o meio-dia e as seis da tarde, eles vibram todos os dias, levando os sons claros e alegres através das campinas, até se encontrarem com as coxilhas distantes, onde perdem a força e esmaecem no espaço.

São sinos importados, doados por dona Zilá Camargo, patrona de todas as iniciativas do Padre Bermauganter (ou padre Berma, como é tratado carinhosamente por seus paroquianos) e instalados na torre na década de 1950.

A população da cidade, constituída quase que exclusivamente de descendentes de imigrantes italianos e alemães, de elevado espírito religioso, frequenta uma das duas igrejas locais: a Igreja de Santa Isabel, católica, e Igreja Evangélica, cujos serviços são de responsabilidade do Pastor Oliveira Bastos.

A instalação de sinos na torre da Igreja Evangélica constituiu um grande momento de alegria para os evangélicos, e também para muitos católicos, já que as relações são mantidas em um nível de muita compreensão e entendimento.

Da mesma forma que os sinos da Igreja de Santa Isabel, os da Igreja Evangelista tocam três vezes ao dia: às seis e meia, meio e dia e seis da tarde. Igualmente pomposos, a sonoridade pode ser notada até muitos quilômetros de distância do centro da cidade.

Nos últimos tempos, entretanto, os sons dos sinos, tão agradáveis e por vezes nostálgicos, passaram a ser motivo de queixas da população. É que tanto os sinos da igreja católica como da igreja batista começaram a ser acionados por dois, três e até cinco minutos. Cada igreja foi aumentando o tempo, à medida que a outra aumentava.

Se por vinte ou trinta segundos já fazem bastante barulho na praça central, imagine-se o blém-blém-blem ou o dão-balão-dão-dão por mais de um minuto, ao mesmo tempo e acima das cabeças dos moradores e dos que transitam pela praça.

Houve reclamações mas ninguém se atreveu a falar com o padre ou com o pastor. Foi preciso a intervenção da Justiça, no sentido de aliviar os habitantes centrais de tamanha balburdia campanal.

A nova regra foi definida após reuniões com o Ministério Público: as igrejas católica e evangélica se comprometeram em reduzir para mais ou menos 40 segundos o tempo das badaladas de seus sinos.

O Pastor Bastos nada falou, apenas colocou em prática o acordo firmado.

Já o padre Berma, como todo bom alemão diante de uma ordem, obedeceu, mas reclamou:

— As sinas tem de tocar muito. Se as sinas não tocarrem, como os católicos van saber que horras son?

Até dona Zilá, a doadora dos Sinos, não se conteve ante tal disparate.

Ai! padre Berma, tenha santa paciência!

ANTONIO ROQUE GOBBO
Belo Horizonte, 23 de janeiro de 2013
Conto #767 da Série Milistórias.

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